terça-feira, agosto 23, 2005

(Mais outra) nova reciprocidade

Não param de nos surpreender as "reciprocidades" estabelecidas com o nosso "Boassas". Desta feita trata-se do admirável e muito musical desNORTE (ainda bem, se há algo que apreciamos é música). Neste caso há até uma passagem pela aldeia, documentada com algumas fotografias (Casa do Cubo, Cruzeiro e Capela de N.ª Sr.ª da Estrela, etc.). Muito obrigado pela referência, sentimo-nos verdadeiramente lisonjeados e honrados por estabelecer esta "reciprocidade" com o desNORTE, que passa, a partir deste momento, a ser mais uma consulta assídua.

Ecologia e construção, uma questão urgente. [Um texto do Professor Jacinto Rodrigues]


ECOLOGIA E CONSTRUÇÃO, uma questão urgente

No actual modelo civilizacional, que tem o petróleo como principal fonte de energia, a construção de edifícios é a maior indústria responsável pelo esgotamento dos recursos naturais e é também a que provoca uma maior contaminação do planeta.

CONSTRUÇÃO versus POLUIÇÃO.
O esgotamento e a poluição resultantes do uso da água, a poluição resultante do uso do petróleo, a poluição de todos os resíduos resultantes da construção são responsáveis por muitas das poluições globais (efeito de estufa, mudança climática, chuvas ácidas, etc.).
O relatório Handbook of Sustainable Building, 1996, ed. James & James, London, refere que 40 por cento dos gastos de energia são utilizados na construção e 40 por cento da poluição resulta da indústria de construção. O consumo mundial da energia aparece assim distribuído: metade da energia é gasta na construção, nos transportes e na indústria.
A consciência ecológica parece ter acordado mais depressa no que diz respeito ao esgotamento e poluição resultantes da opção feita pelos transportes e pela indústria. Só raramente se colocam problemas ecológicos sobre a opção adoptada no tipo de construção. Assim, só muito recentemente surgiram programas europeus que apelam para uma mudança nos materiais, nos processos construtivos e no método de funcionamento (bioclima, gestão controlada e uso de energias renováveis). O programa francês HQE (Haute Qualité Ambientale - Alta Qualidade Ambiental) está essencialmente a ser usado nas construções públicas especialmente ligadas ao sector educacional.
Na Europa, é na Holanda que se verifica uma maior aplicação dum “método de preferência ambiental” e somente agora se avança com o projecto de lançar o programa Thermic, a desenvolver por toda a comunidade europeia, no que diz respeito aos métodos de construção, aos materiais utilizados e às opções energéticas na manutenção climática dos edifícios.

O CASO DE PORTUGAL
As opções construtivas em Portugal e, sobretudo a política energética defendida, colocam o nosso país numa situação calamitosa. Em muitos aspectos, Portugal tem as melhores condições para uma outra política energética, baseada em energias renováveis (vento, sol, hídrica, biomassa, etc.). Seria de todo o interesse o uso de materiais naturais e saudáveis, biodegradáveis, através de novas tecnologias de construção e processos ecológicos de funcionamento energético e de gestão bioclimática.
Começa agora a falar-se na necessidade de se empreenderem grandes mudanças na produção energética. O Ministério do Ambiente refere uma meta: 40 por cento de produção de energias renováveis no consumo para 2010. Contudo, há ainda que analisar a questão do esbanjamento energético e a problemática da utilização de materiais poluentes nas construções em Portugal. É assim urgente uma mudança no ensino da arquitectura e na formação profissional dos quadros ligados à construção civil e às indústrias dos materiais de construção, assim como uma renovação das estruturas empresariais. Aqui ficam as grandes linhas de intervenção de um programa estratégico essencial:
- As faculdades de arquitectura terão de iniciar um debate estratégico de desenvolvimento, elegendo outros “modelos” de arquitectura que não serão necessariamente os modelos hegemónicos. A crítica da crítica da arquitectura não se pode desenvolver a partir de aspectos formais. Interessam conceitos que permitam mostrar outras arquitecturas e outras cidades centradas numa perspectiva de desenvolvimento ecologicamente sustentado. Em vez do debate ficar centrado nos gestos estéticos formais, é preciso articular estética e ética e revelar uma forma de habitar diferente, ou seja, mais integrada na renovabilidade energética e na biodegradabilidade.
No fundo, a questão central do ensino da arquitectura e do urbanismo é substituir o modelo-máquina pelo modelo-ecossistema.
- Pontos de urbanização assentes numa malha policêntrica de pólos urbanos e de sistemas de produção energética descentralizados e renováveis: biodepuradoras; minicentrais multienergéticas (aplicação simultânea de eólicas, colectores solares, biogás, etc.)
- Renaturalização da actual paisagem urbana para que a bioclimatização seja realizável. Através de jardins biodepuradores, corredores verdes, bosques, hortas e agricultura biológica urbana articulados com a bioconstrução, desenvolver-se-ão os traços fundamentais do ecourbanismo. A escolha dos materiais de construção é importante. Em vez de betão ou cimento, em exclusividade, pode apostar-se na construção em madeira, cânhamo, aglomerados de bambu, etc.
- É também necessário complementar esta ecopólis com ecotransportes.
- Estas inovações na arquitectura têm que se inserir numa óptica geral de paisagem como bem público. Daí que os planos para um território devam ser pensados em termos de ecossistemas, para uma melhor distribuição e utilização das águas e das fontes de energias renováveis. O policentrismo urbano impõe-se ao desenvolvimento.
Através de um religar de conhecimentos, as universidades deveriam trabalhar no sentido de explicitar uma realidade ecoterritorial articulada com os conteúdos sociais e políticos do ecodesenvolvimento que impõe uma nova forma de pensar. Essa forma de pensar e a ecofilosofia, ou ecossofia, exigem novos comportamentos.

Jacinto Rodrigues

[Professor Catedrático da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto]
In revista “Pedra e Cal”, ano VI, n.º 25, Janeiro / Fevereiro / Março 2005

quarta-feira, agosto 10, 2005

Será esta a próxima vítima?


(photo . arq. Renato de Brito . all wrights reserved)

É um dos poucos exemplares de arquitectura tradicional de Boassas ainda intacto (e em bom estado de conservação). Sabe-se que foi vendido recentemente e que os novos proprietários pretendem fazer obras. O nosso apelo fica desde já registado, no sentido de que não se venha a destruir mais uma peça do património arquitectónico de Boassas, que esteve, inclusive, na origem da sua classificação recente como "ALDEIA DE PORTUGAL". Não tenhamos dúvidas de que o futuro de Boassas passa, impreterívelmente, pela preservação da sua cultura, das suas tradições, dos seus usos e costumes e... óbviamente, do seu património construído. Permitir a sua destruição é hipotecar o futuro da população da aldeia, é comprometer a réstea de esperança que reside nos passos que têm vindo a ser dados no sentido da promoção e desenvolvimento deste povoado milenar.

quinta-feira, agosto 04, 2005

(Outra) nova reciprocidade

O "boassas" conta, desde o passado dia 27 com uma nova reciprocidade. Trata-se, desta feita, do fantástico BIOTERRA, que era já para nós uma referência e que se torna agora omnipresente... e indispensável. Obrigado!

terça-feira, agosto 02, 2005

Algumas notícias sobre Boassas


(photo . cerveira pinto . all wrights reserved)

Acções recentes da Associação Por Boassas
1. A expensas próprias a APOBO levou recentemente a cabo a limpeza da Avenida Pinto Branco, ou Largo da Capela. Espera-se agora que a população colabore, no sentido de manter sempre aprazível aquela que é, na realidade, a "sala de visitas" da aldeia.
2. Através de contacto com a Junta de freguesia de Oliveira, na pessoa do seu presidente Jorge Teresinho, foi mandado limpar o caminho denominado da "Fonte-da-Pedra", pelo que aqui endereçamos desde já o nosso agradecimento. No entanto, fazemos também o reparo pela forma pouco zelosa com que tal trabalho foi efectuado...
3. Mediante reclamação efectuada para o pelouro do ambiente da Câmara Municipal de Cinfães, foi mandado retirar o autocarro velho que se encontrava na berma da estrada, junto do Campo do Facho (campo de jogos do Grupo Desportivo de Boassas), pelo que aqui fica também expresso o nosso agradecimento. No entanto, na mesma altura, fizemos também mais duas reclamações: uma sobre os depósitos constantes de lixo na berma da estrada Pias-Souto-do-Rio, por baixo da capela de Pias, na margem do Bestança e outra pela destruição da zona arbórea protegida, também junto a Pias, isto sem que, até agora, tenha havido qualquer resultado...
4. Foi formulada à Direcção Geral das Florestas a classificação da árvore denominada "Cipreste da Casa do Outeiro", não tendo ainda havido resposta.
5. Foram efectuados contactos com a direcção da cooperativa "Dólmen", no sentido de haver um apoio do programa "Leader +" para o "II Encontro Internacional de Ceramistas em Boassas", que se deverá realizar em Abril do próximo ano. Neste sentido estão também já a ser convidados os artistas participantes nesta próxima edição.
6. Está neste momento em preparação o lançamento do primeiro concurso fotográfico sobre Boassas da APOBO, o qual deverá ser lançado ainda este mês. O resultado deverá dar início a uma colecção de postais ilustrados sobre a aldeia, contribuindo para a divulgação das suas belezas patrimoniais e paisagísticas.
7. Está a ser preparado um "dossier" para a integração da APOBO na Associação de Turismo de Aldeia (ATA).

Breves...
A Associação Por Boassas internacionalizou-se, pois o artista/ceramista espanhol Rafael Pérez, e sua esposa Carmen, fizeram-se recentemente seus associados.

Neste momento o número de sócios da APOBO encontra-se prestes a atingir a centena.

A Associação de Turismo de Aldeia (ATA) manifestou a intenção de fazer coincidir a sua reunião/congresso anual com o "Encontro Internacional de Ceramistas em Boassas" previsto para o próximo ano.

A Câmara de Cinfães deu uma subvenção de 720 euros (em duas vezes), mediante a apresentação do plano de actividades e orçamento da APOBO para o corrente ano. (Note-se: isto não é uma anedota!!...)

Carta sobre o Património Construído Vernáculo (II)

A destruição do património construído vernáculo de Boassas tem sido uma preocupação constante e é um dos pontos fulcrais da acção da Associação Por Boassas. Continuamos e concluímos, assim, a publicação da "Carta sobre o Património Construído Vernáculo", na esperança de que se sensibilize quem de direito, para que se pare, definitivamente, a destruição desta imensa riqueza local e que se preserve ainda (e recupere) o que for possível, nesta aldeia agora classificada como "Aldeia de Portugal" e que espera honrar esse epíteto e essa distinção. Trata-se de uma carta complementar à Carta de Veneza, formalizada pela Comissão Científica Internacional sobre a Arquitectura Vernácula (CIAV), "criada em 1976, no seio do Conselho Internacional dos Monumentos e Sítios (ICOMOS) e que procura aprofundar o estudo e os meios para a preservação da arquitectura dita "popular" em todo o mundo. Composta por peritos de vários países, a CIAV promove um congresso científico anual, colabora na apreciação de candidaturas a património mundial na área da arquitectura popular e elaborou a Carta sobre o Património Construído Vernáculo." (Miguel Brito Correia, in: "Pedra e Cal", ano VI, n.º 25, Março de 2005, pp. 35)

PRINCÍPIOS DE CONSERVAÇÃO
«1. A conservação do património construído vernáculo ou tradicional deve ser realizada por especialistas de diversas disciplinas, que reconheçam o carácter inevitável da mudança e do desenvolvimento, bem como a necessidade de respeitar a identidade cultural das comunidades.
2. As intervenções contemporâneas nas construções, nos conjuntos e nos povoados de expressão vernácula devem respeitar os seus valores culturais e o seu carácter tradicional.
3. O património vernáculo raramente se exprime através de construções isoladas. Será, pois, melhor conservado se forem mantidos e preservados os conjuntos e os povoados representativos de cada região.
4. O património construído vernáculo é parte integrante da paisagem cultural e essa relação deve ser tomada em consideração na preparação de programas de conservação.
5. O património vernáculo abrange não apenas as formas e os materiais dos edifícios, estruturas e espaços, mas também o modo como estes elementos são usados e interpretados pelas comunidades e ainda as tradições e expressões intangíveis que lhes estão associadas.

ORIENTAÇÕES PRÁTICAS
1. Investigação e documentação
Qualquer intervenção física em património vernáculo deve ser cautelosa e precedida de uma análise completa da sua forma e organização. A documentação recolhida deve ser conservada em arquivos acessíveis ao público.
2. Relação com a paisagem
As intervenções em património construído vernáculo devem respeitar e manter a integridade dos sítios onde este património se implanta, bem como a relação com a paisagem física e cultural e ainda garaatir as relações de harmonia entre as construções.
3. Métodos tradicionais de construção
A continuidade dos métodos tradicionais de construção e das técnicas e ofícios associados ao património vernáculo são fundamentais para o restauro e reconstrução destas estruturas. É através da educação e da formação que estes métodos e este domínio das técnicas e ofícios devem ser conservados, registados e transmitidos às novas gerações de artífices e construtores.
4. Substituição de materiais e de elementos arquitectónicos
As transformações que satisfaçam legitimamente as necessiadades contemporâneas devem ser realizadas com materiais que assegurem uma coerência de expressão, de aspecto, de textura e de forma com a edificação original.
5. Adaptação e reutilização
A adaptação e a reutilização de construções vernáculas devem ser efectuadas respeitando a integridade, o carácter e a forma destas estruturas e compatibilizando a intervenção com os padrões de habitabilidade desejados. A perenidade dos métodos tradicionais de construção pode ser assegurada através da elaboração, pela comunidade, de um código ético ajustável às intervenções.
6. Critérios relativos a alterações
As alterações feitas ao longo do tempo nos edifícios devem ser consideradas como parte integrante da Arquitectura Vernácula. Por isso, a sujeição de todos os elementos de uma edificação a um período histórico único não deve constituir, normalmente, o objectivo das intervenções no património vernáculo.
7. Formação
Para conservar os valores culturais da Arquitectura Vernácula ou tradicional, os governos e as autoridades competentes, as associações e as organizações ligadas a estes objectivos devem dar prioridade:
a) A programas educativos que transmitam os fundamentos do património vernáculo aos técnicos ligados à sua salvaguarda;
b) A programas de formação para apoiar as comunidades a preservar os métodos e os materiais tradicionais de construção, bem como as respectivas técnicas e ofícios;
c) A programas de informação que sensibilizem o público, nomeadamente os jovens, para o valor da arquitectura vernácula;
d) Às redes inter-regionais de arquitectura vernácula para intercâmbio de conhecimentos e experiências.»

(in: LOPES, Flávio; CORREIA, Miguel Brito, Património Arquitectónico e Arqueológico, Cartas, Recomendações e Convenções Internacionais, Lisboa, Livros Horizonte, 2004, pp. 285-288.)